No Dia do Metroviário, a companhia relembra um importante serviço prestado pelos funcionários da operação: o auxílio a usuários com mobilidade reduzida
No vaivém diário pelas 27 estações do Metrô-DF, muitas histórias passam despercebidas. No Dia do Metroviário, comemorado em 26 de outubro, o destaque vai para passageiros que dificilmente seguem no anonimato, especialmente para os agentes de segurança e os agentes de estação. Pessoas com deficiência (PcDs), que muitas vezes não conseguem trafegar sozinhas pelo sistema, recebem tratamento diferenciado, fruto de uma iniciativa dos metroviários.
Em 2022, foram registrados 16.923 mil atendimentos a esse público especial. Até setembro desde ano, o número foi de 13.200 acompanhamentos e monitoramentos – a maioria direcionada a deficientes visuais (7.100) e cadeirantes (5.300). Alguns desses usuários deixam marcas de gentileza, gratidão e emoção nos metroviários.
É o caso de Wanderson Câmara Lustosa, 38, morador de Ceilândia que nasceu surdo e foi perdendo a visão na adolescência até ficar totalmente cego. Ele mora sozinho em uma casa cujo lote abriga outras residências de parentes, próximo à Estação Terminal Ceilândia. E faz questão de manter a sua independência.
Desenvolvendo a comunicação
Pode ser difícil imaginar a vida de um surdocego vivendo sozinho e trabalhando, mas Wanderson esbanja leveza e carrega um sorriso no rosto sempre que chega à estação para se dirigir ao trabalho. Ao se aproximar do bloqueio, normalmente ele recebe um toque no ombro de um metroviário.
Cordialmente, tenta escrever com os dedos, na mão do agente, a estação do seu destino, que pode ser a do Guará, próximo ao seu trabalho, ou a 112 Sul, onde funciona a Central de Intermediação em Libras (CIL) da Secretaria Extraordinária da Pessoa com Deficiência do DF (SEPD), que promove o acesso de PcDs aos serviços públicos com acessibilidade de comunicação em Libras. Lá elas são direcionadas a hospitais, fóruns, escolas públicas, bancos e delegacias, entre outros locais, conforme a necessidade.
Quando há dúvidas sobre o destino de Wanderson, o agente de estação dá papel e lápis e ele escreve. Mas, ao longo de mais de dois anos fazendo os trajetos no Metrô-DF com regularidade, sua comunicação vai ficando cada vez mais intuitiva. Agentes de estação e de segurança embarcam e desembarcam Wanderson para que ele chegue com tranquilidade ao seu destino.
Protocolo
Os metroviários desenvolveram um protocolo para oferecer o serviço de acompanhamento especializado às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Ano a ano, esse protocolo é aperfeiçoado para atender cada vez melhor as necessidades das pessoas com deficiência.
Elas são recepcionadas no acesso das estações metroviárias por um empregado operacional. Nesse primeiro contato, o segurança ou agente de estação se identifica e informa ao Centro de Monitoramento da Segurança (CMS), que fica na sede do Metrô-DF, dados sobre o embarque, a estação de destino e o tipo de auxílio necessário.
A partir desse momento, no CMS, o operador registra as informações em um sistema e passa a monitorar o usuário. Além do acompanhamento do trem por meio do monitoramento, os operadores do CMS fazem contato com a estação de destino, repassando os dados. Há um aviso sonoro no sistema quando o trem se aproxima do destino.
Acompanhamento
“Mesmo quando o passageiro dispensa o auxílio, nós monitoramos seu embarque, porque é importante saber que temos no sistema uma pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida caso haja alguma intercorrência durante a viagem ou se houver a necessidade de evacuar algum trem, por exemplo”, explica a gerente de Segurança Operacional do Metrô-DF, Paula Camargo.
O desembarque e a condução do usuário até a saída da estação também são acompanhados pelo CMS. Apesar de o protocolo ter sido criado apenas para o acompanhamento dentro do sistema do Metrô, no caso específico de Wanderson, muitas vezes o empregado que o recebe na Estação Guará também o acompanha até o ponto de ônibus e pede apoio ao motorista do coletivo ou a algum passageiro, para que avise a Wanderson no ponto de desembarque mais próximo ao trabalho dele.
A equipe de comunicação do Metrô-DF acompanhou um trajeto do Wanderson de casa para o trabalho. Ele chega à estação Terminal Ceilândia sozinho. Já conhece o caminho a pé até a estação porque foi treinado e memorizou. “Ele é impressionante, sempre muito cordial, sempre com um sorriso no rosto”, conta Gustavo Santos, da Gerência de Estações.
Dia a dia
Wanderson trabalha no Centro de Treinamento de Educação Física Especial (Cetefe), uma associação sem fins lucrativos, no Guará. Presta serviço para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que tem um convênio com o centro. São 113 colaboradores efetivos que atuam na digitalização e remontagem de processos, todos surdos ou surdos com outras deficiências.
“É um dos melhores funcionários que nós temos”, conta a intérprete Maria das Dores Rodrigues dos Reis. Ela e Wanderson se conheceram na igreja há muitos anos e se reencontraram quando ele foi encaminhado para o Cetefe.
Interação
Com dois irmãos surdos e uma irmã cadeirante, Maria é formada em letras, com especialização em Libras, e tem pós-graduação na área. Para se comunicar com Wanderson, ela também utiliza o tato, desenhando as palavras na mão. E é por seu intermédio que o rapaz conversa na reportagem.
“Eu sou muito grato ao Metrô por proporcionar minha mobilidade e também pelo carinho e atenção com que me tratam”, afirma Wanderson, na fala traduzida por Maria. “Eu me sinto seguro dentro do sistema e tenho a certeza que vou chegar ao local desejado.”
Maria reitera a importância do protocolo utilizado para as pessoas com deficiência. “O Metrô-DF traz uma solução”, aponta. “Até descobrirmos o Metrô, muitos não tinham como se locomover com segurança. Hoje, se eu entregar um menino surdo ou surdocego ou cadeirante numa estação e disser qual é o destino dele, tenho segurança de que ele vai chegar sem problema. É a única possibilidade que o Wanderson, por exemplo, tem para trabalhar”.
Superação
A agente de estação Karla Alonso é uma das que normalmente recepcionam Wanderson na Estação Guará. Ela recebe o aviso do CSM sobre o trem em que ele está, aguarda a chegada à plataforma, entra no trem e toca o ombro ou a mão de Wanderson. Com sensibilidade aguçada, ele já a reconhece, sobretudo pelos cabelos. Os dois criaram uma forma de se identificar mutuamente.
“Além de ser um exemplo incrível, Wanderson se mostra grato e gentil, e para nós é muito gratificante acompanhá-lo, saber que estamos trabalhando pela inclusão e proporcionando a sensação de segurança às pessoas com deficiência que transitam pelo Metrô-DF”, afirma Karla.
A funcionária pública aposentada Cícera da Silva, 59, por causa de uma poliomielite na infância, nunca andou. Moradora de Ceilândia Norte, ela usava o Metrô-DF todos os dias para trabalhar e, nos fins de semana, também para passear.
Depois da aposentadoria, conquistada há dois anos e meio, Cícera seguiu com as viagens de metrô. “Os meninos [agentes e seguranças] brincam comigo, dizendo que eu não dou sossego para eles, e aí eu respondo que é para eles não me esquecerem”, brinca.
Ela faz vários percursos para ir ao shopping, Hospital Sarah, entre outros trajetos. As estações por onde mais passa são Terminal Ceilândia, Central, Galeria, Ceilândia Norte, Ceilândia Centro, Guariroba e Praça do Relógio.
“Os agentes e seguranças não medem esforços para oferecer o melhor atendimento, têm todo carinho e paciência com a gente, que precisa ser auxiliada por eles”, conta ela. “Sou suspeita para falar, porque amo e defendo todos aqueles que sempre me auxiliaram e continuam me ajudando.”
*Com informações do Metrô-DF